Os deslocamentos e ultrapassagens de fronteiras na Informática são sempre contínuos. Utilizando-se da necessidade de autocriar para incorporar novos recursos para a manipulação de informações, a Informática se autocanibaliza. E destrói em muito pouco tempo, produtos, processos e conceitos firmes gerados por ela ou já assimilados e em utilização como padrão pela massa de usuários. E faz isto com muita naturalidade e inclusive como objeto de anseio por seus utilizadores, que sempre esperam a próxima versão com seus novos aparatos tecnológicos que transformarão a maneira de o mundo comportar e ditarão quais serão as novas regras da fase seguinte.
Uma grande transformação causada pela Informática neste milênio, foi a comunicação de voz pela Internet (VOIP – Voz Sobre IP). As empresas telefônicas foram obrigadas a jogar fora o modelo completo de organização anterior, baseado em cobrança por pulsos e se transformar da noite para o dia em outro tipo de empresa: em empresa de tecnologia digital. Pois com a tecnologia VOIP, os clientes destas empresas não pagam mais pulsos para falar para qualquer lugar do mundo utilizando os computadores, Internet e softwares gratuitos. Isto tudo com qualidade e sem nenhum custo com empresas telefônicas (MAIA, 2005).
A Informática, nestas condições se apresenta como um novo agente da efemeridade que leva a questionar se a era atual é ainda a contemporaneidade ou uma nova era. E até mesmo se o princípio de “eras” ainda se aplica em períodos tão curtos de transformações importantes.
De acordo com PEIXOTO (1988), hoje o real é ele mesmo uma questão. As autopistas de alta velocidade da informatização, transformam por completo o perfil das grandes cidades e, portanto, a experiência e a maneira de ver. O indivíduo contemporâneo é em primeiro lugar um passageiro metropolitano; em permanente movimento, cada vez para mais longe, cada vez mais rápido. Esta crescente velocidade determinaria não só o olhar mas sobretudo, o modo pelo qual a própria cidade e todas as outras coisas se apresentam.
A Informática também tem um papel importante como agente cognitivo e de transformação pessoal. Pois, com os novos conceitos de representação e gravação magnética, a memória está sendo substituída pelos algoritmos de armazenagem, indexação e procura. Estes algoritmos são os novos atores que transportam e conduzem o aprendizado e a percepção, sem que se tenha que decorar conteúdos. Com a tecnologia da informação, qualquer conteúdo está disponível sempre que necessário, através de pesquisas aleatórias dentre contextos variados e até combinados.
A ideia de memória artificial existe até hoje, quando nos referimos aos computadores e falamos de sua “memória”. A diferença entre a memória artificial dos antigos e a atual, consiste no fato de que a deles era desenvolvida como uma capacidade do sujeito do conhecimento humano, enquanto a atual deposita a memória nas máquinas e quase nos despoja da necessidade de termos memória (CHAUI, 2002, p. 127).
Mais memória no hardware de sua imaginação cognitiva
Há na Informática mais que apenas depósito de dados estáticos, mais que apenas memória. Existe uma central de processamento com capacidade de organizar, indexar, classificar, combinar, compilar, calcular e representar os dados memorizados. E isto faz com que o computador passe de instrumento de transformação à agente cognitivo, principalmente quando executa tarefas árduas de procura e representação de grandes conteúdos de datas remotas, que não estão mais em evidência na área de atenção do ser humano. Outra prova do computador como agente cognitivo, são os softwares que conseguem simular o mundo real com tamanha naturalidade e confiabilidade, ao ponto de substituir os antigos testes e treinamentos das indústrias, laboratórios acadêmicos e empresariais, que eram realizados com objetos reais e de custos elevados. Os computadores empregados na robótica das indústrias, principalmente as automobilísticas, já determinam as rotas dos operadores e como as atividades devem ser realizadas, incluindo exceções e interferências que ocorrem nos processos.
Quando uma nova informação ou um novo fato surge diante de nós, devemos, para gravá-lo, construir uma representação dele. No momento em que a criamos, esta representação encontra-se em estado de intensa ativação no núcleo do sistema cognitivo, ou seja, está em nossa zona de atenção, ou muito próxima a esta zona. Não temos, portanto, nenhuma dificuldade em encontrá-la instantaneamente. O problema da memória de longo prazo é o seguinte: como encontrar um fato, uma proposição ou uma imagem que se achem muito longe de nossa zona de atenção, uma informação que há muito tempo não esteja em estado ativo? (LÉVY, 1993, p. 79).
E é exatamente este um dos papéis da Informática, disponibilizar e trazer os dados, a representação construída e arquivada para a zona de atenção no momento que se precisa dela, libertar para o processo de criação e transformação de dados em informação. Com isto, pode-se evoluir de utilizadores passivos de dados para agentes ativos e construtores de conhecimento. Pode-se fazer parte da transformação e não somente receber as conseqüências das novas regras e fronteiras.
Passar de agente passivo para agente ativo num processo de efemeridade contínuo, pode parecer simples, mas, faz toda a diferença quando isto implica a possibilidade de obter a reboque, as melhorias aquisitivas que transformam as condições de vida, abrem portas para as realizações profissionais e principalmente pessoais de cada membro da sociedade.
Transdisciplinaridade na prática
Transdisciplinaridade: Como o prefixo ‘trans’ indica, a transdisciplinaridade diz respeito ao que está, ao mesmo tempo, entre as disciplinas, através das diferentes disciplinas e além de todas as disciplinas. Seu objetivo é a compreensão do mundo presente, e um dos imperativos é a unidade do conhecimento (NICOLESCU, 1999, p. 9).
O papel transformador da Informática é conectar os assuntos comuns que se espalham entre as culturas e distâncias, principalmente ser um agente da transdisciplinaridade, permitindo a aproximação de comunidades científicas e acadêmicas através da tecnologia de comunicação, armazenamento e disponibilidade destes portfólios organizados e combinados por assuntos eletronicamente. Permitindo que especialistas, de áreas correlatas ou não, trafeguem por itinerários de conhecimentos produzidos por comunidades de culturas e ambientes desconhecidos, ou que sejam impossíveis de serem reproduzidos no ambiente atual do especialista. Isto possibilita responder às restrições da memória humana de longo prazo, das pesquisas e descobertas individuais e da complexidade da fusão do todo. As representações também passam a ser transmitidas em larga escala para públicos que até então não tinham acesso a tudo isso, duram de forma autônoma, inclusive construindo vida e significados independentes e novos, quando um assunto se conecta pelas interseções dos novos padrões de comunicação oferecidos pela Informática a todos os setores onde está presente.
Eu noto que cada vez mais a Ciência da Computação se torna parte integrante de novas áreas do conhecimento, por exemplo, da Bioinformática. Mais do que ferramentas de atuação de outras áreas científicas, a Computação passa a ser incorporada integralmente ao desenvolvimento e à linguagem dessas áreas (NOBRE, 2006, p. 10).
Com as facilidades de registros, armazenamento, transmissão e cruzamento automático das informações e principalmente a possibilidade de simulações que a Informática oferece, problemas que até então não tinham soluções começam a ser resolvidos como subproduto de outras pesquisas3 . Isso reforça a idéia de que quem tem informação tem poder.
Um exemplo de solução de problema obtido como subproduto de pesquisa, ocorreu recentemente quando a interseção de duas especialidades, a dermatologia e oncologia, descobriu o medicamento para evitar quedas de cabelos, a FINASTERIDA. Este medicamento já era usado para tratamento de hiperplasia da próstata e com testes para redução da dose até um limite que ainda permanecesse eficiente e gerasse menores efeitos colaterais, chegou-se a dose para tratamento da alopécia (queda de cabelo) (GORMLEY, 1995).
A rapidez, a flexibilidade, a enorme capacidade de armazenamento e processamento proporcionadas pela ferramenta Informática fizeram dela o instrumento maior da administração dos homens e dos bens. A circulação e o uso das informações estratégicas nas três áreas estreitamente ligadas da economia, ciências e armas, apóiam-se integralmente nas redes de teleinformática que encerram o planeta em malhas a cada dia mais estreitas. O computador é um formidável fator de poder (LÉVY, 1998, p. 161).
LEVY (1988) e BLATTMANN (1999), também citam outra transformação que está ocorrendo desde a metade do século passado, provocando reconfigurações dos ambientes, dos espaços e sendo a mola-mestra impulsionadora de novas tecnologias, é o crescimento constante e em proporções sempre maiores de parte da população que está passando do labor manual para o trabalho do conhecimento, transformando e propagando informação.
O trabalho manual está gradativamente sendo substituído com ferramentas que auxiliam na qualidade, rapidez e eficiência dos serviços e/ou produtos efetuados. Estas ferramentas são as novas tecnologias. Mas devido o ser humano apresentar restrições ao novo e moderno, conseqüentemente as relutâncias interferem desde a dificuldade de aprendizagem até a tecnofobia (medo de utilizar novas tecnologias). Novas tecnologias e o contínuo aprender. As novas tecnologias nas organizações estão enfocadas na utilização de novas metas para a tecnologia de informação e na computação em rede, aberta e centrada no usuário (BLATTMANN, 1999, p. 4).
O Tecnocosmo
A disseminação dos equipamentos de cálculos transforma o tipo de habilidade cognitiva necessária aos operários, que precisam recorrer cada vez mais ao raciocínio abstrato e estar inclusos num mundo de códigos e mensagens. A comunicação substitui o labor e a necessidade de esforço físico: os computadores estão em toda parte, controlam tudo: o tráfego aéreo, as redes ferroviárias, os vôos espaciais, a distribuição da energia elétrica, o calor, a água, os robôs, as ferramentas, as linhas completas de produção, a vigilância de prédios, as centrais nucleares, os processos complexos e tudo que se apóia no tecnocosmo, provocando o afastamento gradativo dos objetos (LEVY, 1998).
Na era das novas tecnologias de comunicação e informação, o conteúdo qualitativo do trabalho passa a ser privilegiado, transformando-se, assim, sua concepção. O trabalho passa a ser uma série de aplicações de conhecimentos, onde os indivíduos voltam suas capacidades para a programação e o controle, e isto traz como exigência se pensar a formação dos indivíduos para o trabalho com base em pressupostos pós-fordistas, sob os quais novas habilidades estão sendo demandadas. Temos hoje um aumento das exigências de aptidões para o trabalho, considerando-se uma base de conhecimentos mais amplos, exigência de capacidade para resolução de problemas, exigência para tomada de decisões autônomas, capacidade de abstração e comunicação escrita e verbal. Somando-se a isto, o trabalhador deve ser polivalente, e com maior nível de escolaridade. Polivalente no sentido de multiqualificado, isto é, aquele que é capaz de desenvolver e incorporar diferentes competências e repertórios profissionais (SIQUEIRA, 2003, p. 1).
A inteligência do homem consiste em transformar a sua sociedade inteligente: mensagens, linguagens, ferramentas e instituições. A inteligência trabalha na conexão, conecta o homem com seus semelhantes e com dimensões que só existem de fato para os seres humanos, o longínquo, o passado, o futuro. Para conectar cada vez mais, o homem tem se apoiado na tecnologia. Uma tecnologia que é antes de tudo humana, por que é uma extensão do corpo e dos sentidos. O que torna os seres humanos únicos é o desejo de entender e conhecer o futuro, a necessidade de adaptação às novas tecnologias que são criadas e desenvolvidas. “Uma membrana de cálculo e informação codificada estende-se entre o corpo dos homens e o mundo técnico. Mídia das mídias, tecnologia de controle das técnicas, a Informática condiciona doravante a possibilidade do tecnocosmo” (LÉVY, 1998, p. 16).
Agora que a Informática atingiu preços incrivelmente baixos e se acha presente em todos os segmentos da vida, estamos à beira de uma nova revolução. Desta vez, envolvendo comunicações a preços sem precedentes; todos os comutadores vão se unir para se comunicar conosco e por nós. Interconectados globalmente, formarão uma rede que está sendo chamada de estrada da informação, da qual a Internet atual é uma precursora direta (GATES, 1995, p. 56).
Com todas estas transformações e mudanças de hábitos, as novas fronteiras se deslocam rapidamente também dentro da escola e é na sala de aula que se recebem os verdadeiros agentes da cognição: os professores e alunos da nova era digital, que podem ter como responsabilidade transformar a tecnologia em grande aliada do ser humano.
A tecnologia sempre afetou o homem: das primeiras ferramentas, por vezes consideradas como extensões do corpo, à máquina a vapor, que mudou hábitos e instituições, ao computador que trouxe novas e profundas mudanças sociais e culturais – a tecnologia nos ajuda, nos completa, nos amplia (FRÓES, 1998, p. 56).
Pense nisto e não perca as oportunidades que a Tecnologia da Informação pode lhe oferecer.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
• BLATTMANN, Úrsula. Organizações no paradigma de transformação. Revista de Biblioteconomia e Ciência da Informação – UFSC. São Carlos, Nº 7, abr./1999.
• CHIAUI, Marilena. Convite à filosofia, 12 ed. São Paulo: Ática, 2002.
• FRÓES, R.M. A Relação homem-máquina e a questão da cognição. In: Secretaria de ensino a distância. Salto para o Futuro: TV e Informática na educação. Série de estudos Educação a distância. Brasília: Ministério da Educação e do Desporto, SEED, 1998.
• GATES, Bill. A Estrada do Futuro. São Paulo: Companhia das Letras, 1995.
• GORMLEY G.J. Finasteride: A clinical review. Biomed Pharmacother, Elsevier: Paris, v. 49, n. 7-8, p. 319-324, 1995.
• LÉVY, Pierre. As tecnologias da inteligência. São Paulo: Editora 34, 1993.
• LÉVY, Pierre. A Máquina universo - criação, congnição e cultura Informática. Porto Alegre: ArtMed, 1998.
• MAIA, Rogério. Tecnologia da Informação. Divinópolis – TV Candidés – Emissora da Rede TVE Brasil, 2005.
• NICOLESCU, B. Et al. Educação e transdisciplinaridade. Brasília: Unesco, 1999.
• NOBRE, Carlos. Especialistas debatem a multidisciplinaridade. Revista Computação Brasil - Sociedade Brasileira de Computação. Porto Alegre. Ano VII, n. 23, p. 10, 2006.
• PEIXOTO, Nelson Brissac. O olhar do estrangeiro. In. NOVAIS, Adauto, O olhar. São Paulo: Companhia das Letras, 1988, p. 487-492.
• SIQUEIRA, Holgonsi Soares Gonçalves. A nova concepção de trabalho. Jornal A Razão, Santa Maria, Artigo, p. 1. Edição de 01/05/2003.